domingo, 22 de junho de 2025

MARIA LUIZA DA CUNHA LOBO

 Novos artigos de segunda #37

Fonte da imagem: Reprodução de página do Livro do Centenário da Academia Maranhense de Letras 


MARIA LUÍZA LOBO – AINDA UMA INCÓGNITA

José Neres

 

Há muitas nuvens e mistérios envolvendo a história da literatura maranhense. Embora hoje já contemos com um bom número de pesquisas acerca das letras do Maranhão, ainda há muito por descobrir.

Um desses mistérios envolve a vida e a obra da professora e escritora Maria Luíza da Cunha Lobo, filha do casamento do intelectual maranhense Antônio Lobo com Dona Lucrécia Izaura da Cunha Lobo.

Em primeiro lugar, nem mesmo se tem certeza sobre o ano exato do nascimento dessa escritora. Pesquisando em jornais antigos, é possível encontrar diversas homenagens a ela prestadas por ocasião de seu aniversário, em 02 de março, mas é preciso uma busca mais aprofundada em cartórios, igrejas e demais arquivos para dirimir dúvidas.

É pelas páginas dos jornais antigos que se fica sabendo também que, em agosto de 1916, logo após o triste e trágico desaparecimento de seu pai, que ela e sua mãe comunicam aos amigos a mudança para a rua Colares Moreira, nº 47. Provavelmente tal alteração de endereço se deu por conta dos traumas deixados na antiga residência da família, que não suportou continuar vivendo no lar onde perdeu seu pai.

Os rastros deixados por Maria Luíza Lobo são poucos, mas nos permite visualizá-la em novembro de 1921 fazendo provas de Álgebra, História, Língua Portuguesa e demais disciplinas no Liceu Maranhense. Foi possível encontrar também nos arquivos pessoais do grande pesquisador Jomar Moraes, uma dedicatória de Antônio Lobo para sua filha em dedicatória na folha de rosto do livro A doutrina transformista e a variação microbiana. O livro foi publicado em 1909, mas o autógrafo (à minha querida filha Maria Luíza) é datado de 9-9-1913.

Poucos são os registros sobre sua vida pessoal, mas no dia 15 de abril de 1925, na página 3 do jornal A Folha do Povo, foi possível localizar essa interessante nota sobre seu noivado.

O Sr. Leocádio Martins Ribeiro, sócio da conceituada firma Rodrigues Drumond e Cia, no domingo último, pediu em casamento a inteligente e prendada Maria Luíza Lobo, filha do ilustre jornalista Antônio Lobo.

Aos jovens distintos noivos, elementos de relevo da nossa culta sociedade apresentamos nossos votos de felicidade

Seguindo os caminhos trilhados pelo pai, ela também mergulhou no mundo do magistério e pode ser encontrada ministrando aulas de Geografia para a turma do terceiro ano na escola que levava o nome de seu genitor. Percebe-se também que, em 1928, ela pede licença remunerada para tratamento de saúde, fato que se repete no ano seguinte.

Os jornais também nos informam que pela Portaria Governamental do dia 30 de agosto de 1946, ela foi nomeada para fazer um estágio na Capital Federal, com bolsa no valor diário de Cr$ 50,00. Nessa época, ela ocupava o cargo de professora de Sociologia Educacional na Escola Normal do Instituto de Educação. No mesmo ano, mas no mês de outubro, Maria Luíza Lobo foi nomeada Consultora-Técnica do Diretório Regional de Geografia.

No ano seguinte, em 1947, essa notável intelectual foi encontrada em Florianópolis, representado o Maranhão no Primeiro Congresso Nacional de Educação de Adultos. Nesse mesmo período, é possível encontrar diversas referências a sua atuação em diversos campos do saber como, por exemplo, a música, o civismo e as relações interpessoais. Algumas de suas palestras sobre casamento, divórcio, menores abandonados e educação podem ser encontradas em jornais antigos do Maranhão e de outros estados da federação.

Quem sabe um dia apareça um/a pesquisador/a que aceite o desafio de vasculhar a vida e a obra dessa mulher que tem passado despercebida em nossa historiografia!!!

Ainda não descobrimos a data do falecimento dessa escritora, no entanto, foi possível identificar que sua mãe faleceu em 1953, no Rio de Janeiro, e que seu corpo foi sepultado no Cemitério São João Batista. A notícia fala que ficam uma filha – “a poetisa Maria Luísa Lobo, e dois sobrinhos, o senhor Dácio Souza, comerciante, e dona Maria do Carmo Santos, viúva do pranteado Nhozinho Santos”, o que indica que até a quele anos nossa escritora ainda seguia seu caminha na face da terra. Depois disso, há poucas informações.

No entanto, parece que o ano mais significativo da vida intelectual de Maria Luiza Lobo foi o de 1935. Foi nesse ano que ela publicou, pela Officina Industrial Graphica, do Rio de Janeiro, seu livro intitulado Traços na Areia, que foi recebido com elogios por parte de Domingos Barbosa, que revelou, em seu texto que:


Ao receber o volume, que se intitula “Traços na Areia”, assaltou-me à mente – enchendo-me o coração de saudade, – uma série de recordações.
E de todas a mais viva foi exatamente ela, Maria Luíza, que eu revi tamanhinha, barafustando e tagarelando em meio aos que amiúde nos reuníamos na Biblioteca do Mestre, para ela o melhor dos pais, para nós o melhor dos companheiros.
A precocidade de sua inteligência já se revelava agudamente vivaz, faz com que o volume recebido não seja, propriamente, uma surpresa.”, segundo texto reproduzido em O Imparcial de 11 de julho de 1935.


O livro, que aparentemente é uma coletânea de crônicas, foi bem recebido pela imprensa da época e recebeu diversos elogios. Infelizmente, trata-se de uma obra que a qual ainda não tivemos acesso.

Foi em 1935 também que Maria Luiza Lobo se inscreveu para a cadeira nº 3 da Academia Maranhense de Letras. Cadeira esta que estava vaga desde a segunda metade de 1926, quando houve o passamento de João da Costa Gomes, que era conhecido literariamente como João Quadros. Consta que Maria Luíza Lobo foi eleita, mas por algum motivo até agora desconhecido, não tomou posse. Mesmo assim em vários documentos e em várias revistas, ela é apresentada como pertencente aos quadros de sócios efetivos da AML. Infelizmente não conseguimos localizar a ata dessa eleição e não há outros registros formais disponíveis sobre esse acontecimento. Fato é que essa cadeira só voltou a ser ocupada em 1939, com a eleição e posse de Assis Garrido.

Sendo verdadeira essa informação, Maria Luíza da Cunha Lobo é a primeira mulher a ser eleita para a Academia Maranhense de Letras. Seria bom se alguém se dispusesse a aprofundar essas anotações!!!

Terminamos essas breves, esparsas e incompletas informações sobre essa escritora maranhense com a reprodução de dois de seus poemas publicados em jornais e revistas. O primeiro – Ave, Brasil – foi publicado no Semanário de Orientação Católica, de 1954. E o segundo foi reproduzido da Revista Aspectos – ano I.

Boa leitura!

 

AVE, BRASIL

(Maria Luiza Lobo)

 
Meu Brasil, meu Brasil, ó minha terra! 
O meu país natal idolatrado!
Terra grandiosa e rica em que se encerra 
O nosso orgulho, pelo teu passado! 
 
O teu nome Refulge entre as mais belas 
Constelações do firmamento azul, 
Em letras de ouro escrito, nas estrelas 
Do majestoso Cruzeiro do Sul! 
 
Nessa cruz misteriosa que reluz,
Numa benção de paz no céu de anil, 
Terra de Deus! Terra de Santa Cruz! 
Bendito sejas sempre, ó meu Brasil!
 
Terra Formosa! Terra em que as campinas
São sempre verdes e a sorrir nas flores! 
Brasil, terra de sol, Terra das minas,
Paraíso das aves multicores! 
 
Terra de extensas e opulentas matas.
E grandes rios de mortal beleza! 
Terra das fontes e das cataratas! 
Maravilha sem par na natureza! 
 
Pátria de um povo Nobre e generoso, 
Temente a Deus e que ama seu país! 
Que tem fé no futuro e, valoroso, 
Trabalha sempre pra te ver feliz.
 
Ave, Brasil, ó meu país natal!
Teu nome viva em nossos corações. 
Só temos um desejo, um só ideal: 
– Ver-te a mais forte e rica das nações! 
 
Por ti, conquistaremos a vitória,
E a morte enfrentaremos a sorrir. 
Confia em nós, Brasil, e espera a glória 
Que haveremos de dar-te no porvir! 

(Maranhão: Semanário de Orientação Católica 16 de dezembro de 1945.pág. 03)

 

PAISAGEM TROPICAL

Maria Luiza Cunha

 

Pleno deserto, ardente, ao sol do meio-dia,
Pleno deserto, nu, todo em fogo abrasado.
Árida vastidão, de amarga nostalgia.
Terreno ressequido, estéril, requeimado.
 
Areal cintilante, à luz de um sol candente,
Que vermelho aparece e rubro se agasalha,
Causticante, cruel, impiedoso, inclemente,
Como um campo de guerra após uma batalha.
 
É uma orgia de sol, num perpétuo verão!
Catarata de fogo, insondável,imensa…
É tão vasta, que escapa aos raios da visão,
E é tanta luz, que ofusca e vibra, de intensa.
 
Muito ao longe, se veem uns morros isolados,
Recobertos de pó, de fogo consumidos, 
Calcinados do sol, austeros, escalvados,
Alevantando aos céus os cumes ressequidos.
 
Por toda a parte, enfim, calor, e mais dor…
Em derredor, o vácuo… inteira solidão!...
Aspérrima rijeza, à calma do equador!...
Pleno aluvio de luz!... Pasmosa inanição!...
 
Pelo fofo areal, movediço e escaldante,
Lá vai a caravana, em marcha sonolenta…
Arrimado ao bordão, o Beduíno, adiante,
Os camelos conduz na estrada poeirenta.
 
E lá vai, pausadamente, até sumir-se nessa
Fímbria de ouro e carmim que ao longe se divisa…
Serás nesse horizonte, além que o céu começa
E o rútilo deserto enorme finaliza?

(Revista Aspectos - anno I, pág. 56)

4 comentários:

  1. O poeta é escritor José Neres, sempre com galantia e garantia surge com nomes e pergaminhos esquecidos pelo tempo.

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    1. Importante fazer esse trabalho de tirar da invisibilidade nossos escritores. Obrigado!

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  2. Aprecio as informações sobre pessoas como Maria Luíza Lobo que fazem parte da história de São Luís, deixando suas marcas a serem seguidas. Obrigada, pela sua dedicação, José Neres.

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    1. Boa tarde, há muitas outras personalidades que precisam ser lembradas e revistas. Obrigado pelo comentário.

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