Novos artigos de segunda #37
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Fonte da imagem: Reprodução de página do Livro do Centenário da Academia Maranhense de Letras |
MARIA LUÍZA LOBO – AINDA UMA INCÓGNITA
José Neres
Há muitas nuvens e mistérios envolvendo a história da literatura
maranhense. Embora hoje já contemos com um bom número de pesquisas acerca das
letras do Maranhão, ainda há muito por descobrir.
Um desses mistérios envolve a vida e a obra da professora e
escritora Maria Luíza da Cunha Lobo, filha do casamento do intelectual maranhense
Antônio Lobo com Dona Lucrécia Izaura da Cunha Lobo.
Em primeiro lugar, nem mesmo se tem certeza sobre o ano exato
do nascimento dessa escritora. Pesquisando em jornais antigos, é possível encontrar
diversas homenagens a ela prestadas por ocasião de seu aniversário, em 02 de
março, mas é preciso uma busca mais aprofundada em cartórios, igrejas e demais
arquivos para dirimir dúvidas.
É pelas páginas dos jornais antigos que se fica sabendo também
que, em agosto de 1916, logo após o triste e trágico desaparecimento de seu pai,
que ela e sua mãe comunicam aos amigos a mudança para a rua Colares Moreira, nº
47. Provavelmente tal alteração de endereço se deu por conta dos traumas
deixados na antiga residência da família, que não suportou continuar vivendo no
lar onde perdeu seu pai.
Os rastros deixados por Maria Luíza Lobo são poucos, mas nos
permite visualizá-la em novembro de 1921 fazendo provas de Álgebra, História,
Língua Portuguesa e demais disciplinas no Liceu Maranhense. Foi possível
encontrar também nos arquivos pessoais do grande pesquisador Jomar Moraes, uma
dedicatória de Antônio Lobo para sua filha em dedicatória na folha de rosto do
livro A doutrina transformista e a variação microbiana. O livro foi
publicado em 1909, mas o autógrafo (à minha querida filha Maria Luíza) é
datado de 9-9-1913.
Poucos são os registros sobre sua vida pessoal, mas no dia 15
de abril de 1925, na página 3 do jornal A Folha do Povo, foi possível
localizar essa interessante nota sobre seu noivado.
O Sr. Leocádio
Martins Ribeiro, sócio da conceituada firma Rodrigues Drumond e Cia, no domingo
último, pediu em casamento a inteligente e prendada Maria Luíza Lobo, filha do
ilustre jornalista Antônio Lobo.
Aos jovens
distintos noivos, elementos de relevo da nossa culta sociedade apresentamos
nossos votos de felicidade
Seguindo os caminhos trilhados pelo pai, ela também mergulhou
no mundo do magistério e pode ser encontrada ministrando aulas de Geografia para
a turma do terceiro ano na escola que levava o nome de seu genitor. Percebe-se
também que, em 1928, ela pede licença remunerada para tratamento de saúde, fato
que se repete no ano seguinte.
Os jornais também nos informam que pela Portaria
Governamental do dia 30 de agosto de 1946, ela foi nomeada para fazer um
estágio na Capital Federal, com bolsa no valor diário de Cr$ 50,00. Nessa época,
ela ocupava o cargo de professora de Sociologia Educacional na Escola Normal do
Instituto de Educação. No mesmo ano, mas no mês de outubro, Maria Luíza Lobo
foi nomeada Consultora-Técnica do Diretório Regional de Geografia.
No ano seguinte, em 1947, essa notável intelectual foi
encontrada em Florianópolis, representado o Maranhão no Primeiro Congresso
Nacional de Educação de Adultos. Nesse mesmo período, é possível encontrar diversas
referências a sua atuação em diversos campos do saber como, por exemplo, a
música, o civismo e as relações interpessoais. Algumas de suas palestras sobre
casamento, divórcio, menores abandonados e educação podem ser encontradas em
jornais antigos do Maranhão e de outros estados da federação.
Quem sabe um dia apareça um/a pesquisador/a que aceite o
desafio de vasculhar a vida e a obra dessa mulher que tem passado despercebida
em nossa historiografia!!!
Ainda não descobrimos a data do falecimento dessa escritora,
no entanto, foi possível identificar que sua mãe faleceu em 1953, no Rio de Janeiro,
e que seu corpo foi sepultado no Cemitério São João Batista. A notícia fala que
ficam uma filha – “a poetisa Maria Luísa Lobo, e dois sobrinhos, o senhor Dácio
Souza, comerciante, e dona Maria do Carmo Santos, viúva do pranteado Nhozinho
Santos”, o que indica que até a quele anos nossa escritora ainda seguia seu
caminha na face da terra. Depois disso, há poucas informações.
No entanto, parece que o ano mais significativo da vida
intelectual de Maria Luiza Lobo foi o de 1935. Foi nesse ano que ela publicou, pela
Officina Industrial Graphica, do Rio de Janeiro, seu livro intitulado Traços
na Areia, que foi recebido com elogios por parte de Domingos Barbosa, que
revelou, em seu texto que:
“Ao receber o volume, que se intitula “Traços na Areia”,
assaltou-me à mente – enchendo-me o coração de saudade, – uma série de
recordações.
E de todas a mais viva foi exatamente ela, Maria Luíza, que
eu revi tamanhinha, barafustando e tagarelando em meio aos que amiúde nos
reuníamos na Biblioteca do Mestre, para ela o melhor dos pais, para nós o melhor
dos companheiros.
A precocidade de sua inteligência já se revelava agudamente
vivaz, faz com que o volume recebido não seja, propriamente, uma surpresa.”,
segundo texto reproduzido em O Imparcial de 11 de julho de 1935.
O livro, que aparentemente é uma coletânea de crônicas, foi bem
recebido pela imprensa da época e recebeu diversos elogios. Infelizmente,
trata-se de uma obra que a qual ainda não tivemos acesso.
Foi em 1935 também que Maria Luiza Lobo se inscreveu para a
cadeira nº 3 da Academia Maranhense de Letras. Cadeira esta que estava vaga desde
a segunda metade de 1926, quando houve o passamento de João da Costa Gomes, que
era conhecido literariamente como João Quadros. Consta que Maria Luíza Lobo foi
eleita, mas por algum motivo até agora desconhecido, não tomou posse. Mesmo assim
em vários documentos e em várias revistas, ela é apresentada como pertencente
aos quadros de sócios efetivos da AML. Infelizmente não conseguimos localizar a
ata dessa eleição e não há outros registros formais disponíveis sobre esse
acontecimento. Fato é que essa cadeira só voltou a ser ocupada em 1939, com a eleição e posse de Assis Garrido.
Sendo verdadeira essa informação, Maria Luíza da Cunha Lobo é
a primeira mulher a ser eleita para a Academia Maranhense de Letras. Seria bom
se alguém se dispusesse a aprofundar essas anotações!!!
Terminamos essas breves, esparsas e incompletas informações
sobre essa escritora maranhense com a reprodução de dois de seus poemas
publicados em jornais e revistas. O primeiro – Ave, Brasil – foi publicado no
Semanário de Orientação Católica, de 1954. E o segundo foi reproduzido da
Revista Aspectos – ano I.
Boa leitura!
AVE, BRASIL
(Maria Luiza Lobo)
Meu Brasil, meu Brasil, ó minha terra!
O meu país natal idolatrado!
Terra grandiosa e rica em que se encerra
O nosso orgulho, pelo teu passado!
O teu nome Refulge entre as mais belas
Constelações do firmamento azul,
Em letras de ouro escrito, nas estrelas
Do majestoso Cruzeiro do Sul!
Nessa cruz misteriosa que reluz,
Numa benção de paz no céu de anil,
Terra de Deus! Terra de Santa Cruz!
Bendito sejas sempre, ó meu Brasil!
Terra Formosa! Terra em que as campinas
São sempre verdes e a sorrir nas flores!
Brasil, terra de sol, Terra das minas,
Paraíso das aves multicores!
Terra de extensas e opulentas matas.
E grandes rios de mortal beleza!
Terra das fontes e das cataratas!
Maravilha sem par na natureza!
Pátria de um povo Nobre e generoso,
Temente a Deus e que ama seu país!
Que tem fé no futuro e, valoroso,
Trabalha sempre pra te ver feliz.
Ave, Brasil, ó meu país natal!
Teu nome viva em nossos corações.
Só temos um desejo, um só ideal:
– Ver-te a mais forte e rica das nações!
Por ti, conquistaremos a vitória,
E a morte enfrentaremos a sorrir.
Confia em nós, Brasil, e espera a glória
Que haveremos de dar-te no porvir!
(Maranhão: Semanário de Orientação Católica 16 de dezembro
de 1945.pág. 03)
PAISAGEM TROPICAL
Maria Luiza Cunha
Pleno deserto, ardente, ao sol do meio-dia,
Pleno deserto, nu, todo em fogo abrasado.
Árida vastidão, de amarga nostalgia.
Terreno ressequido, estéril, requeimado.
Areal cintilante, à luz de um sol candente,
Que vermelho aparece e rubro se agasalha,
Causticante, cruel, impiedoso, inclemente,
Como um campo de guerra após uma batalha.
É uma orgia de sol, num perpétuo verão!
Catarata de fogo, insondável,imensa…
É tão vasta, que escapa aos raios da visão,
E é tanta luz, que ofusca e vibra, de intensa.
Muito ao longe, se veem uns morros isolados,
Recobertos de pó, de fogo consumidos,
Calcinados do sol, austeros, escalvados,
Alevantando aos céus os cumes ressequidos.
Por toda a parte, enfim, calor, e mais dor…
Em derredor, o vácuo… inteira solidão!...
Aspérrima rijeza, à calma do equador!...
Pleno aluvio de luz!... Pasmosa inanição!...
Pelo fofo areal, movediço e escaldante,
Lá vai a caravana, em marcha sonolenta…
Arrimado ao bordão, o Beduíno, adiante,
Os camelos conduz na estrada poeirenta.
E lá vai, pausadamente, até sumir-se nessa
Fímbria de ouro e carmim que ao longe se divisa…
Serás nesse horizonte, além que o céu começa
E o rútilo deserto enorme finaliza?
(Revista Aspectos - anno I, pág. 56)