domingo, 10 de agosto de 2025

A SAÚDE MENTAL DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO

 Novos artigos de segunda #44

Imagem criada com auxílio de Inteligência Artificial

A SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO 

José Neres 


Estou na docência desde 1991. De lá para cá são quase três décadas e meia de sala de aula e algo que sempre me deixou preocupado é a saúde mental das pessoas que trabalham na Educação.

Para quem não vive as rotinas de uma escola, a vida do professor e dos demais atores envolvidos com a Educação parece ser algo fácil: “basta dar a aula ou executar algumas tarefas burocráticas e ir embora”. “Os sortudos ainda contam com duas férias por ano”. Mas a realidade não é bem assim.

Existe toda uma dinâmica invisível, que vai além da sala de aula, dos corredores e dos muros de uma instituição de ensino, e que pode levar esses profissionais a um adoecimento físico e mental. Não se trata apenas do esperado cansaço após uma jornada de trabalho, muita vezes em condições adversas, da exposição a ruídos que extrapolam os limites recomendados, do esforço repetitivo diante de um quadro, da vista cansada após uma exaustiva sessão de correção de provas e trabalho ou da certeza de uma remuneração que está muito aquém do esforço despendido. Há outras situações que nem sempre são percebidas por quem não está a par dessa realidade.

Constantemente, vejo colegas com o olhar perdido no horizonte e com as marcas da desesperança estampadas até mesmo nas mais sutis palavras e nos  movimentos involuntários. A angústia tornou-se  parte do uniforme de muitos educadores.

Esses profissionais vivem em constante estado de insegurança. A violência, que antes era apenas tema de algumas aulas, há muito tempo já invadiu o ambiente escolar e tem deixado marcas físicas e psicológicas em suas vítimas, conforme pode ser visto em reportagens e depoimentos que são compartilhados e reproduzidos à exaustão.

Muitos professores e demais funcionários vivem a angústia de não poderem projetar nem mesmo um futuro próximo, pois trabalham assombrados pelo fantasma da dispensa ou de alguma remoção para um lugar afastado do seu perímetro de atuação.

Praticamente todos já perceberam que não têm voz nem vez, pois as decisões são tomadas sem a participação de significativa parte da comunidade escolar. Resta então obedecer ao que foi determinado, de preferência sem questionamentos, pois questionar nem sempre é interpretado como uma tentativa de ajudar a compor um cenário mais democrático, mas sim como uma afronta a uma ordem de quem se julga superior aos próprios colegas. Muitos, então, optam pelo silenciamento das próprias ideias. E isso não traz bons resultados.

Há ainda o caso dos profissionais que recebem tarefas para as quais não foram preparados. Diante da angústia de não poderem executar as atividades da forma que desejariam e, muitas vezes, pressionadas por todos os lados, essas pessoas acabam substituindo o prazer do trabalho por crises de ansiedade ou mesmo por constantes episódios de Burnout, o que geralmente culmina com picos de estresse, desânimo, esgotamento físico, sensação de fracasso e até alteração nas funções básicas do organismo.

Constantemente, escuto colegas dizendo que estão arrependidos da profissão que escolheram ou, pior ainda, abusando de medicamentos, muitas vezes sem acompanhamento profissional. Há também casos daqueles que se entregam a drogas lícitas e ilícitas e ao vício de jogos, o que acaba piorando a saúde mental desses trabalhadores.

Em 2010 escrevi um artigo intitulado “O Do(c)ente” tratando sobre o assunto. De lá para cá parece que nada mudou, ou melhor dizendo, o pouco mudou parece que foi para pior. De lá para cá, tenho sempre tratado do assunto, buscando compreender as causas e as consequências desse fato incontestável, mas que nem sempre é discutido nas chamadas formações e nas reuniões.

Parece que a saúde mental dos profissionais da Educação é um mais um daqueles assuntos que são constantemente varridos para debaixo de um tapete de ilusões.



Leia outro artigo sobre o assunto clincando aqui


4 comentários:

  1. Perfeito, caro amigo Neres! Ano passado fui diagnosticada com início de Síndrome de Burnout - um cansaço imenso e a sensação de que não conseguia mais dar conta de tudo nem organizar minha vida.Sou professora e amo minha profissão, a qual exerço há 20 anos. Mas precisei entender que as pausas são necessárias e realmente as férias devem ser FÉRIAS. A sobrecarga de trabalho dentro e fora de sala de aula é descomunal e acachapante. Hoje estabeleço limites sérios tb para não me envolver com problemas de alunos, pois a conta do emocional sempre chega.

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  2. Excelente abordagem deste artigo!
    O grande mestre José Neres, sempre com artigos de relevância.
    Parabéns!!!

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  3. A Resistência é Coletiva.
    Ainda culpam professores por "não saberem lidar com o estresse" ou sugerir que façam mais terapia individual. O problema é sistêmico. Enquanto a Educação for tratada como gasto, e não como investimento, os professores continuarão doentes, e toda a sociedade pagará o preço. A solução está ligada em romper a cultura do silêncio, falar o que sente e fortalecer a união entre educadores, onde os próprios colegas não compreendem as dores do outro(infelizmente)
    A luta pela saúde mental docente é, no fundo, a luta por uma Educação que valha a pena para professores e alunos.

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  4. Na verdade a saúde mental é negligenciada, acredito que seja por não ser algo aparente, nem todos conseguem alcançar um semblante exausto ou um olhar que denuncia dor. Os problemas de ordem mental não são detectados num exame de imagem como um osso quebrado, por exemplo, desse modo acabam agindo de forma preconceituosa e ainda dizem que é preguiça. Lamentável.

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A SAÚDE MENTAL DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO

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