sábado, 21 de dezembro de 2024

RUA DO VIEIRA

 

Fonte da imagem: Arquivo pessoal do autor 

Nasci na Rua do Vieira, em São José de Ribamar. Embora tenha passado poucos meses por lá e visitando apenas raramente o local, sei que ali estão minhas raízes e as ramificações de minha família 

Deixo então essa pequena homenagem a esse chão que me viu nascer.


RUA DO VIEIRA

José Neres

(Para minhas avós - Maria Paula, materna;
e Maria Isabel, paterna)

I

Aquela rua parecia estanque
As notícias corriam devagar
Ali em São José de Ribamar:
Santo-Cidade de amor e de sangue.

Foi ali que nasci, um menino exangue,
Perto da lama, do céu e do mar.
Era pleno Carnaval. Era noite de luar…
Primeiro cheiro que senti foi do mangue.

Foi na tímida rua do Vieira,
Onde canta o Sabiá sem palmeira
Que derramei meu primeiro chorar.

Com tantas lágrimas por derramar,
Deixei aquela íngreme ladeira
Onde está minha lágrima primeira.


II

E Depois, ainda na infância minha,
Ao Vieira voltei para visitar…
A rua parecia outro lugar
Só então conheci minha madrinha

Primos, tios e uma doce vozinha
Com brancos cabelos a pentear…
Na sala, outra vovó estava a cantar,
Orando, uma singela ladainha.

Era janeiro, a rua a toda em festa
Vida e saúde agradecia a Deus…
Só pessoa boa e muito honesta…

Ali estão tantos parentes meus,
Com calos nas mãos e suor na testa
Sobrevivendo dos trabalhos seus.


III

Diante da casa de piso rude
Existe um muro feito de memória 
Onde, por mais que viaje ou se estude,
Está enterrada nossa bela história.

Seja na doença, seja na saúde,
Nosso passado é nossa maior glória,
Foi nele que fiz tudo o que pude 
Foi nele que plantei minha vitória.

Todo passado é indelével açude 
Onde afogar-se é cena obrigatória
E perde-se pode até ser virtude.

O que digo não é peça de oratória:
Meu passado cola em mim como grude
Mas não me vejo preso em rotatória.


IV

Após dobrar o canto do Cruzeiro
Com a Vieira logo se depara,
Pode ser o ponto verdadeiro
Onde todo bom coração dispara.

Lá no final há um porto pioneiro 
Onde o vulto de meu pai me prepara
Uma pescada assada no braseiro,
Com o sal da saudade misturada.

Ali mamãe conta o pouco dinheiro
De toda uma vida sempre regrada 
Seja em dezembro, seja outro janeiro…

Se toda rua pode ser sagrada,
Nosso lugar deve ser o primeiro 
Pois ali teve origem nossa estrada…


10 comentários:

  1. Lindas memórias afetivas que foram vividas e hoje lembrada no embalo das letras com sentimentos natos.

    ResponderExcluir
  2. Muito linda a homenagem 👏🏾

    ResponderExcluir
  3. A história de uma vida tão íntegra em poesia fica mais bela ainda. Belíssimos versos!

    ResponderExcluir
  4. Belo registro de memórias afetivas! 👏👏👏

    ResponderExcluir
  5. Adriana de Jesus Silva22 de dezembro de 2024 às 04:26

    Que lindo poema pleno de memórias afetivas e histórias!😍👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼

    ResponderExcluir

25 - FERREIRA GULLAR

 Fim de ano e também fim de projeto. Ao longo de vários meses, homenageamos duas dezenas e meia de escritores maranhenses.  Tudo começou qua...